23.6.06

Ancestrais

[no lixo, luiz antônio gusmão]

"A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou"

Ouvia as histórias sentado, quieto, olhos abertos querendo engolir a figura falante, o corpo inclinado para frente em expectativa.

"Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou"

E havia as músicas, ah, canções simples e fortes de um tempo que jamais conheci.

"sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?"

Quem poderia dizer o que viria, e apesar da memória o tempo passa, o corpo e seu enchimento de carne vai falhando.

"Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou"

A boca contadora balbucia, a mente imaginativa hoje é fugidia, e a lucidez só visita ocasionalmente.

"Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você consasse,
se você morresse...."

Contava e ouvia as histórias e canções, sentado e quieto, agora eu, já sem platéia.

(Pai do pai do pai..., Pedro de Caldas Gomes; José, Drummond)

2 Comments:

At 27/6/06 14:58, Anonymous Anônimo said...

I'm in the mood...

bela melancólica fotografia.
bela tradução.

são.

 
At 28/6/06 00:50, Blogger Elenita Rodrigues said...

a foto é perfeita e diz tudo... semânticas... até Drummond perdeu.

 

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