31.3.06

Geração espontânea

[hora do lanche, Pedro de Caldas Gomes]

"Em relação aos animais, alguns nascem de pais animais conforme seu tipo, enquanto outros crescem espontaneamente e não de uma linhagem semelhante; e desses exemplos de geração espontânea alguns provêm da matéria vegetal ou terra em putrefação, como é o caso de certo número de insetos, enquanto outros são gerados espontaneamente no interior de animais, a partir de secreções de seus diversos órgãos."

(Aristóteles, História dos animais)

29.3.06

Miragem

[foto por Andrea Pelagagi]

Cuando se durmió la noche
Abrí sus ojos
Para asegurarme de mi insomnio–

Como el eco
en el desierto,
como el punto
en el mar,
como el camino
sin final,
¿acaso soy yo?

[...]

¿Dónde estás?
¿Bajo mi camisa,
bajo mi párpado,
bajo mi piel?
¿Dónde estás?
¿En mi sangre,
en mi saliva,
en mis entrañas?
No te veo.
¿Eres yo?

[Malak Mustafá]

24.3.06

Colagem

[outdoor, luiz antônio gusmão]

"Destruindo a ilusão, far-se-ia desaparecer todo o interesse da peça. É essa mascarada, esse disfarce que prende os olhos do espectador. Ora, o que é a vida? [...] Em verdade, este mundo não é senão uma sombra passageira, mas assim é a comédia que nele representamos todos os dias." (Desidério Erasmo)

"The world is my expense, the cost of my desire [...] Don't dare take what you need; I'll jail and bury those committed, and smother the rest in greed. Crawl with me into tomorrow or I'll drag you to your grave: I'm deep inside your children, they'll betray you in my name" (R.A.T.M.)

Estética urbana, monopólio espacial, guerra semiótica, poluição visual
Pedra, chão, parede, vidro, outdoor, shopping mall
Quem compõe no canvas vivo,
Quem tem a mensagem real?
(Pedro de Caldas Gomes)

15.3.06

Caminhos

[entroncamento de azulejos, luiz antônio gusmão]

Sigo a linha
até onde
segue outra


[Pedro Gomes]

10.3.06

Rente à superfície

[Forma Molhada, Pedro de Caldas Gomes]


um dia rente
à superfície
abre a escuridão

[luiz antônio gusmão]

4.3.06

Twilight

[crepúsculo, luiz antônio gusmão]

Olha pela estreita janela, a mesma coisa, o telhado e o sol, a moldura retangular. Está cansado desta vista, desta vida, para quê? Do pó viemos, ao pó voltaremos, o adormecer e a noite escura.

Sua rotina mudara muito, a mansidão dos dias ao quarto que virou escritório, o filme, as entrevistas, todos querendo saber como havia feito tudo aquilo. E dizer que tudo começou com Os livros. Havia se acostumado com este novo ritmo, o trabalho e a companhia dos outros, mas ainda continuava alguém à parte, a solidão no meio da multidão de outros como ele, a incompreensão... jamais se imaginara como uma celebridade, como homem de negócios.

Nem por isso deixou de hesitar quando abriram as trancas da porta para dizer-lhe que estava na hora. Finalmente, o abandono de tudo isto, desperdiçara seus dias de sol, mudara apenas no entardecer.

Não havia sido fácil chegar até aqui, mexera muitos pauzinhos, mas demorara tanto... sentado à beira do penhasco, observando o céu tingido, outro dia não pode estar longe. Sorri com a ironia do momento, por que esperar para ver um novo sol? Crer na Bíblia e redimir seu comportamento não mudara as abominações que cometera, qual será a extensão do perdão paterno? Pela vontade e não por injeção letal partirá, e enquanto cai pelo abismo, com um sorriso desafiador no rosto, imagina quantos realmente entenderão a metáfora do crepúsculo.

(Pedro de Caldas Gomes)